✍Artigo: Pr. José
Gonçalves
À luz do Antigo Testamento o projeto original de Deus para o casamento é que ele fosse vitalício. Além disso, o casamento deveria ser monogâmico e heterossexual. O divórcio, portanto, não estava no plano original de Deus para a família. Contudo, sabendo da dureza do coração humano, Deus permitiu a validação do divórcio sob determinadas circunstâncias (Dt 24.1-4, NAA).
Veja também: O que diz a Bíblia sobre Divórcio? Clique Aqui
O Divórcio nos Ensinos de Jesus
Quando
Jesus acabou de proferir estas palavras, deixou a Galileia e foi para o território
da Judeia, além do Jordão. Grandes multidões o seguiram, e ele as curou ali.
Alguns fariseus se aproximaram de Jesus e, testando-o, perguntaram: — É lícito ao
homem repudiar a sua mulher por qualquer motivo? Jesus respondeu: — Vocês não
leram que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher e que disse: “Por
isso o homem deixará o seu pai e a sua mãe e se unirá à sua mulher, tornando-se
os dois uma só carne”? De modo que já não são mais dois, porém uma só carne.
Portanto,
que ninguém separe o que Deus ajuntou. Os fariseus perguntaram: — Então por que
Moisés ordenou dar uma carta de divórcio e repudiar a mulher?
Jesus
respondeu: — Foi por causa da dureza do coração de vocês que Moisés permitiu
que vocês repudiassem a mulher, mas não foi assim desde o princípio. Eu, porém,
lhes digo: quem repudiará sua mulher, não sendo por causa de relações sexuais
ilícitas, e casar com outra comete adultério. (Mt 19.1-9, NAA)
A compreensão dessa
passagem sobre o divórcio é complementada por outras Escrituras
neotestamentárias, que também se relacionam com o assunto (Mt 5.32; Mc 10.2-12;
e Lc 16.18). Jesus esclarece que o divórcio foi uma concessão feita por Moisés
por causa da dureza dos corações, e não que tenha sido esse o propósito
original de Deus para o casamento.
Jesus afirmou que quem
terminasse o casamento e se casasse com outra, exceto em caso de imoralidade
sexual, cometeria adultério. Com isso Jesus desfez todas as interpretações
liberais sobre o divórcio criadas pelas escolas rabínicas que viam qualquer
motivação como justificativa para a prática do divórcio.
O texto deixa claro que
a imoralidade sexual, tradução do termo grego
porneia, é a única exceção permitida por Jesus para o divórcio. Assim,
de acordo com Cristo, quem se divorciasse por outras razões e cassasse
novamente estaria cometendo adultério. Grudem destaca que nesse caso “Jesus
está dizendo que um homem que se divorcia indevidamente de sua esposa não
recebeu um divórcio legítimo e, na verdade, ainda está casado com sua esposa
original no momento em que inicia o segundo casamento”. Dessa forma, Jesus elevou
o conceito de casamento muito além daquele defendido pelas escolas rabínicas.
Outra questão bastante
pertinente a partir da análise desse texto é a permissão dada por Jesus para um
segundo casamento para a parte inocente. Alguns intérpretes objetam que Jesus
não teria permitido no texto de Mateus 19 tal permissão. Argumentam que as
passagens paralelas de Marcos 10.2-12 e Lucas 16.18 não contêm essa cláusula de
exceção. Contudo, não é uma boa forma de fazer exegese partindo do silêncio de
um texto. O silêncio de um texto não pode calar outro que é específico.
Dessa forma, se essa
cláusula de exceção permitida por Jesus em Mateus não está presente em Marcos e
Lucas, as razões devem ser buscadas nos seus respectivos contextos.
O mais provável é que o
Espírito Santo que inspirou Mateus a redigir o seu texto para judeus viu a
necessidade de expor essa regra dada pelo Salvador. Por outro lado, o mesmo
Espírito que inspirou Marcos e Lucas a escreverem para gentios não viu a
necessidade de expor essa cláusula de exceção, pois, como já foi demonstrado,
esse tipo de entendimento já era tido no mundo greco-romano.
No texto de Mateus 19, Jesus
deixou especificamente implícito que uma pessoa que se divorcia de outra em
razão de imoralidade sexual não comete adultério se casar com outra. Assim, A.
T. Robertson entende que “por implicação, Jesus, como em Mt 5.31, permite o
matrimônio da parte inocente, mas não da culpada”. Da mesma forma, Grudem
observa que as palavras de Jesus.
“e se
casar com outra”, sugere que tanto o divórcio quanto o novo casamento são permitidos
no caso de imoralidade sexual, e que alguém que se divorcia porque seu cônjuge
cometeu adultério pode se casar com outra pessoa sem cometer pecado.
Evidente
porque se retirarmos “e se casar com outra”, o ditado não faz sentido: E eu te
digo: quem se divorciar de sua mulher, exceto por imoralidade sexual, [...]
comete adultério. Mas isso não seria verdade, porque alguns casos há maridos
que vão se divorciar de suas esposas e não vão se casar novamente ou viver com
nenhuma outra mulher. Eles permanecerão solteiros e castos. Nesse caso, eles
não estariam cometendo adultério com ninguém, e as palavras de Jesus não fariam
sentido. Portanto, a frase “e se casar com outra” deve estar presente para que
o versículo faça sentido. E isso significa que “todo aquele que se divorciar de
sua esposa [...] e se casar com outra” por causa da imoralidade sexual, não
está cometendo adultério nesse segundo casamento.
Essa, sem dúvida, é a exegese mais precisa dessa passagem e o entendimento
mais natural das palavras de Jesus. Entretanto, deve ser enfatizado que mesmo
Jesus reconhecendo a validade de um novo casamento em razão de traição, Ele não
estimulou a prática do divórcio nem tampouco a ordenou. Há sempre a
possibilidade para o perdão e a reconstrução de uma relação que foi quebrada
por uma das partes.
O Divórcio nos Ensinos de Paulo
Aos
casados, ordeno, não eu, mas o Senhor, que a mulher não se separe do marido. Mas,
se ela se separar, que não se case de novo ou que se reconcilie com o seu marido.
E que o marido não se divorcie da sua esposa. Aos outros, digo eu, não o Senhor:
se algum irmão estiver casado com uma mulher não crente, e esta concorda em
morar com ele, não se divorcie dela. E se uma mulher estiver casada com um homem
não crente, e este concorda em viver com ela, que ela não se divorcie do marido.
Porque o marido não crente é santificado no convívio da esposa, e a esposa não
crente é santificada no convívio do marido crente. Se não fosse assim, os
filhos de vocês seriam impuros; porém, agora, são santos. Mas, se o não crente
quiser separar-se, que se separe. Em tais casos, não fica sujeito à servidão
nem o irmão, nem a irmã; Deus chamou vocês para viverem em paz. (1 Co 7.10-15)
A posição paulina sobre o casamento de cristãos é bem conhecida, contudo,
é também a que mais controvérsias tem gerado. Isso em razão daquilo que os teólogos
denominam de “privilégio paulino”.
Em outras palavras, Paulo estaria dizendo nessa passagem, em casos de
casamentos mistos, que um irmão ou irmã que foram abandonados por um cônjuge descrente
estaria livre para se casar novamente. Esse entendimento surge a partir das
palavras de Paulo: “não fica sujeito à servidão nem o irmão, nem a irmã”
(v.15).
Assim, Grudem argumenta:
Quando combinamos o ensino de Jesus com o ensino de Paulo sobre este
assunto, parece que há pelo menos dois motivos legítimos para o divórcio:
(1) adultério e
(2) deserção por um descrente quando todas as tentativas razoáveis de
reconciliação falharam [...] posição que resumi brevemente aqui — que tanto o
divórcio quanto o novo casamento são permitidos quando o cônjuge de uma pessoa
cometeu adultério ou abandonou irreparavelmente o casamento — é a posição mais
comum mantida entre os protestantes desde a Reforma.
Da mesma
forma, o escritor assembleiano Esequias Soares, ao discorrer sobre 1 Coríntios
7.15, escreve:
Não há
dúvida alguma de que Paulo está falando do divórcio, por mais que se queira
refutar ou negar essa afirmação. Ele não fez ressalva nenhuma do tipo “que fique
sem casar”, como fez no v. 11, visto que emprega o mesmo verbo nos vv. 10 e 11
para “apartar”. Esse entendimento é também confirmado na nota de rodapé da Bíblia
de Estudo Pentecostal. Se o cônjuge incrédulo quiser a separação, ninguém estará
obrigado a manter tal casamento.
Essa é a
exceção do apóstolo Paulo para o divórcio. Depois dessa separação, tanto o
irmão como a irmã estarão livres para contrair novas núpcias. A parte final do
versículo 15 diz: “Em tais casos, não fica sujeito à servidão nem o irmão, nem
a irmã; Deus vos tem chamado à paz” (ARA).
O texto
sagrado afirma que “não fica sujeito à servidão”, o que parece ser referência ao
novo casamento. O divórcio era conhecido e praticado naquela época pelos judeus,
romanos e gregos. Se esse “apartar-se” não fosse uma referência ao divórcio, certamente
o apóstolo teria dito para não se casar, pois estava escrevendo para um povo
familiarizado com o divórcio. Havendo a dissolução do vínculo matrimonial, o
cônjuge fiel, portanto, estava livre para se casar com quem quiser, desde que
“seja no Senhor” (v. 39), alguém que seja crente. O impedimento para contrair
novas núpcias permanece quando a separação acontece por iniciativa da parte
cristã.
A Declaração de Fé das Assembleias de Deus
A Declaração de Fé das Assembleias de Deus mantém entendimento
semelhante reconhecendo que as únicas duas exceções para a dissolução de um casamento
são a infidelidade conjugal e o abandono por parte do cônjuge descrente. Assim,
reza esse documento:
Reconhecemos
o casamento civil e o religioso com efeitos civis desde que não afrontem os
princípios bíblicos e, em especial, não seja realizado entre pessoas divorciadas,
em desacordo com o preconizado pelo Senhor Jesus. A dissolução do casamento é justificada
nos seguintes casos: morte, infidelidade conjugal e deserção por parte do
cônjuge descrente.
Esse documento deixa claro em qual esfera reconhece a validade de um casamento
e em quais situações e casos ele pode ser dissolvido. Assim, de acordo com a Declaração
de Fé um casamento é valido quando feito na esfera civil e religiosa e
quando contempla aqueles casos em que os princípios bíblicos não são feridos.
Por outro lado, de acordo com a redação desse texto, o casamento é
dissolvido quando um dos cônjuges morre, quando há infidelidade e quando um
cônjuge crente é abandonado por um descrente.
Ao afirmar que “a dissolução do casamento é justificada nos seguintes
casos: morte, infidelidade conjugal e deserção por parte do cônjuge descrente”,
esse documento admite a validade de um novo casamento nessas três situações.
Assim como um viúvo está livre para se casar novamente, visto que a morte
dissolveu o seu relacionamento anterior, da mesma forma, quem sofreu
infidelidade ou foi abandonado por seu cônjuge descrente estará livre para
contrair novas núpcias, visto que a infidelidade e o abandono quebraram a
aliança conjugal.
O divórcio e o direito a um novo casamento de
um pastor
Outra questão relacionada ao divórcio e o direito a um novo casamento diz
respeito a pastores. Poderia um pastor que sofreu um processo de divórcio
continuar exercendo o seu ministério pastoral?
A pergunta não é tão fácil de responder quanto parece. Há o aspecto
legal e moral que devem ser levados em conta.
Assim, há aqueles que reconhecem a legalidade de um novo casamento para
ministros que se divorciaram quando eles foram vítimas de infidelidade
conjugal. Nesse caso, argumentam que o adultério dissolveu a aliança conjugal e
o ministro estaria legalmente livre para se casar novamente.
Por outro lado, há aqueles que reconhecem a questão legal envolvida
nessa situação, contudo, acreditam que não é moral um pastor divorciado
continuar exercendo o seu ministério. Nesse caso, o ministro poderia, sim,
contrair novas núpcias, se assim desejasse, contudo, jamais poderia continuar
como ministro do evangelho. Em outras palavras, aqueles que argumentam nesse
sentido acreditam que nem tudo o que é legal é moral.
Sabendo da polarização em torno desse
assunto, a Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB) aprovou
uma resolução que trata da questão do divórcio entre pastores:
A CGADB só reconhece o Divórcio no
âmbito ministerial de seus membros nos casos de infidelidade conjugal,
previstos na Bíblia sagrada e expressos em Mt. 5:31- 32; 19:9, devidamente
comprovados.
As Convenções Estaduais deverão esgotar todos os esforços possíveis no
sentido de promover a reconciliação do Ministro e sua esposa, antes de serem
ajuizadas Ações de Divórcio.
Esta CGADB não reconhece, no âmbito da vida ministerial de seus membros,
a situação de União Estável.
O Ministro, membro desta CGADB, divorciado nos termos do disposto no
art. 1º. desta Resolução ou no caso onde a iniciativa do divórcio partir da sua
esposa (1 Co 7.15), poderá permanecer ou não, na função ministerial, decisão
essa que ficará a cargo da Convenção Estadual da qual é filiado, facultando-se
lhe o direito de recurso para Mesa Diretora e para o para o Plenário desta
Convenção Geral.
O Ministro, vítima de
infidelidade conjugal por
parte de sua esposa, poderá contrair novas núpcias, respeitados os princípios
bíblicos que norteiam a união conjugal, nos termos da permissibilidade
concedida por Cristo, em Mateus 5.31 e 32; 19.9, ficando cada caso a ser
examinado e decidido pelas Convenções Estaduais.
Quando o Ministro der causa ao
divórcio, a sua permanência
ou retorno ao ministério dependerá de exame e decisão da Convenção Estadual,
facultando-se lhe ampla defesa, sendo-lhe também assegurado recurso para a Mesa
Diretora e para o plenário da Convenção Geral.
O Ministro, membro desta CGADB que acolher Ministro divorciado sem a
observância do disposto na presente Resolução, será responsabilizado
disciplinarmente, no âmbito desta Convenção Geral. Ficam os Presidentes de
Convenções e demais membros desta CGADB autorizados a divulgar entre a
membresia das Igrejas Evangélicas Assembleias de Deus em todo o território nacional,
o inteiro teor desta Resolução.
Uma análise dessa resolução da CGADB demonstra pelo menos
três coisas:
1. O divórcio é permitido entre pastores no
caso de infidelidade conjugal por parte da esposa;
2. A decisão de o ministro continuar ou não
no exercício da prática pastoral ficará a cargo de cada convenção
regional/estadual da qual o ministro é membro;
3. O reconhecimento ou não do direito a um novo casamento dependerá de aprovação da convenção regional da qual o ministro faz parte.
Esse documento mostra que, por não haver unanimidade em torno desse assunto
na esfera convencional, a CGADB admitiu a possibilidade do divórcio entre
pastores nos casos especificados, mas deixou a cargo das convenções regionais
decidirem sobre o assunto. Isso porque enquanto algumas convenções são mais
liberais em torno do divórcio, admitindo-o entre seus ministros, outras são bem
mais conservadoras, não aceitando em seus quadros ministros divorciados.
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