A Bíblia possui enorme variedade de textos inquietantes e que, por vezes, exigem maior esmero de seus estudantes, especialmente quando se trata de assuntos dos quais não se verifica a intertextualidade canônica ou que sua compreensão resta prejudicada em razão das poucas pistas e informações textuais.
Cada texto bíblico se enquadra em um gênero
literário e neste caso teremos de abordar um texto cuja classificação literária
é narrativa, haja vista que os evangelhos consistem em textos inspirados por
Deus e escritos por homens segundo aquilo que lhes foi revelado.
O texto em Mateus 27.52-53 trata dos últimos instantes antes da morte de
Jesus, e evidencia os efeitos de Seu sacrifício vicário. Nesta perícope, a
abordagem do evangelista é voltada a relatar os acontecimentos relativos à
crucificação e morte de Jesus, depois a narrativa procede com os fatos
concernentes ao sepultamento e à ressurreição.
Somente o Evangelho Segundo Mateus registra a
informação de que houve um terremoto, que os túmulos se abriram e que os
cadáveres dos santos foram ressuscitados. Tais discrepâncias entre os registros
dos evangelistas revelam do chamado problema sinóptico, pois todos escrevem
sobre os mesmos temas, conforme seus entendimentos, a partir de um ponto de
vista em comum (CHAMPLIN, 1998, p. 174).
Os questionamentos acerca da ressurreição dos
santos naquele contexto são inevitáveis, haja vista que a Bíblia não dispõe de
qualquer outra passagem relacionada ao evento e nem mesmo informações sobre o
que aconteceu com aquelas pessoas que adentraram novamente em Jerusalém e que
foram vistos pela comunidade local.
Fato é que Cristo morreu e ressuscitou ao
terceiro dia e que, por deter todo o poder em Suas mãos (Mt 28.18) e haver
triunfado sobre a morte, possibilitou a ressurreição aos mortos.
Considerando-se a coerência lógica dos acontecimentos, vale ressaltar que os
ressuscitados não precederiam a Jesus, pois Ele foi feito primícia dos que
dormem (1 Co 15.20; Cl 1.18).
Frise-se que, embora pareça fora de contexto, o
versículo 53 do texto em análise afirma que os ressuscitados saíram dos seus
sepulcros depois da ressurreição de Jesus (NVI).
Normalmente, este texto não é alvo de estudos e
pregações devido à falta de elementos que possibilitem a fundamentação do
pensamento bíblico-teológico, mas é possível fazer referência do marco de
transição entre as Dispensações da Lei e da Graça.
Quando os evangelistas afirmam que o véu do
templo se rasgou é pacífico que a barreira existente entre Deus e a humanidade
foi eliminada a partir do sacrifício de Cristo, sendo Ele o mediador da nova
aliança (Mt 26.28; Lc 22.20; 1 Co 11.25; Hb 8.6, 12.24).
Podemos entender que em Cristo fomos vivificados,
chamados da morte para a vida (Jo 5.24), e ainda que não tenhamos os detalhes
da ressurreição daquelas pessoas é certo que Deus operou aquele sinal a fim de
anunciar ao mundo que em Cristo há vitória da vida.
Impossível deixar de conjecturar o susto e alegria dos familiares e amigos dos ressuscitados, na surpresa e força do testemunho daqueles que tiveram contato com estes fatos. Acreditar na ressurreição do Cristo talvez não fosse matéria fácil para a maioria, mas tal testemunho amparado por outros milagres como os citados por Mateus fundamentaram sua veracidade e lançaram os alicerces de nossa fé.
Artigo: Pr. Carlos Eduardo Neres